RIO — O crescimento das fintechs — como são chamadas as start-ups financeiras e os bancos digitais — fez com que uma necessidade antiga dos clientes precisasse ser atendida: um local para sacar dinheiro. Mesmo com a não cobrança de tarifas em cartões de débito e crédito, 60% dos brasileiros ainda utilizam o papel-moeda como principal meio de pagamento. Visando a esse público, fintechs estão usando supermercados, padarias e lojas como caixa.
Em vez de ir ao terminal de autoatendimento e pagar taxas que podem chegar a R$ 6,50 por saque, o cliente pode retirar dinheiro em uma loja, com custos mais vantajosos. A ideia é que os comerciantes usem os recursos do seu estabelecimento para custear essas retiradas, reduzindo o volume de dinheiro no caixa que precisará ser depositado em um banco no fim do dia, a chamada sangria diária.
Tudo é feito por meio de um aplicativo no celular, com QR Code. Não há cartões envolvidos na operação.
A Saxperto é uma start-up que foi lançada em dezembro de 2019 para intermediar o saque entre fintechs e lojas, após seus fundadores, com experiência no mercado financeiro virtual, perceberem a dificuldade que era para o consumidor conseguir retirar dinheiro sem pagar tarifas elevadas.
Acesso no interior
Sem os custos de instalação de um terminal, é possível oferecer taxas mais baixas. Ao abrir o aplicativo da Saxperto, que já está integrado a fintechs como PicPay, Mercado Pago, Nubank, PagBank e Agibank, um mapa exibe os estabelecimentos mais próximos com dinheiro disponível.
— Conseguimos fazer a operação por um custo de até R$ 2,50, com varejistas que tinham o hábito de fazer sangria todo dia. O proprietário ganha na taxa de remuneração e com mais pessoas indo ao negócio dele. São pessoas que acabam comprando algo — destaca o fundador da Saxperto, Tiago Godoi, ex-Mercado Pago.
A start-up, que conta com o incentivo do programa Lift do Banco Central (BC), de fomento à inovação no sistema bancário, tem cerca de cem parceiros e pretende encerrar o ano com 80 mil conveniados, distribuídos pelo país, inclusive no interior, onde a rede bancária é limitada.
Na pequena Ribeiro do Pombal, cidade com 53 mil habitantes no interior da Bahia, a loja de informática de Pierre Santos da Silva, de 31 anos, virou o ponto de saque daqueles que não podem viajar 250 quilômetros até o caixa eletrônico mais próximo.
— Antes, fazia transferência e sacava no banco grande da cidade. Hoje, pode sacar na minha loja, o que é uma vantagem. A onda dos bancos digitais é nova, com certeza vai crescer o fluxo na loja — diz Silva, que viu o movimento crescer 30% com a implementação de serviços financeiros.
O modelo da Saxperto é similar ao da gigante Brinks, empresa americana de transporte de valores que lança em fevereiro a Brinks Pay. Com foco nas carteiras digitais, o empreendimento, criado totalmente no Brasil, pretende utilizar a rede de clientes em mais de três mil municípios para oferecer dinheiro em espécie em lojas. O sistema vai usar parte dos recursos que seria retirado no transporte, reduzindo os custos operacionais da empresa e do lojista, que é remunerado por cada saque.
— Vimos que seria possível dar uma solução abrangente e eficiente ao recolhimento de valores, uma vez que o dinheiro da loja está disponível para saque, aumentando a oferta de serviços para usuários de bancos digitais e tradicionais — explica Gil Hipólito, diretor de Marketing e Novos Negócios da Brinks.
O aumento da capilaridade das fintechs tem se mostrado um desafio. Dados do BC mostram que, em dezembro, 2.274 municípios sequer contavam com caixa eletrônico.
A Saque e Pague, empresa de caixas de autoatendimento, firmou acordo com a ABFintechs para permitir que as mais de 360 instituições associadas possam oferecer o serviço de retirada nos terminais da rede. Com 10% das operações já feitas por 27 parceiros digitais, a ideia é saltar de 260 para 350 cidades atendidas em 2020, com foco no interior.
— Os próximos anos serão desafiadores para cobrir uma parcela importante do país — afirma Givanildo Luz, diretor-presidente da empresa.