Quando pensamos em O Iluminado (1980), o clássico de Stanley Kubrick baseado na obra de Stephen King, é inevitável lembrar das cenas de Jack Nicholson como Jack Torrance, vagando pelos corredores do hotel Overlook, lentamente perdendo a sanidade. A tensão psicológica, os ambientes claustrofóbicos e a sensação de isolamento fazem do filme uma obra-prima do terror, mas também uma rica metáfora para algo mais comum do que gostaríamos de admitir: a angústia de estar preso a um trabalho que não nos traz realização.
Jack Torrance assume o papel de zelador do hotel com a promessa de tranquilidade e recomeço. Ele acredita que o isolamento o ajudará a escrever o tão sonhado livro, mas o que encontra é o oposto: um ambiente sufocante que lentamente consome sua lucidez e sua essência. Não é muito diferente do que acontece quando alguém se vê preso a uma profissão que não ama. Assim como o Overlook, esses trabalhos podem parecer inofensivos ou até promissores no início, mas escondem armadilhas psicológicas que nos deixam exaustos, apáticos e, em alguns casos, completamente perdidos.
No filme, o labirinto de arbustos do hotel é uma das imagens mais simbólicas. Ele representa o desespero, a falta de saída, a sensação de estar perdido. Essa imagem é assustadoramente semelhante à vida de quem trabalha em uma profissão pela qual não sente paixão. O relógio desperta todos os dias, e seguimos a mesma rotina, como se estivéssemos correndo em círculos dentro de um labirinto invisível. É um ciclo repetitivo que, assim como para Jack Torrance, pode levar à frustração, ao estresse e até ao colapso emocional.
Um dos momentos mais icônicos de O Iluminado é quando Wendy, a esposa de Jack, descobre que ele vem escrevendo a mesma frase incessantemente: “All work and no play makes Jack a dull boy” (algo como “Trabalho sem diversão fazem de Jack um bobão”). Esta cena é um retrato perfeito de como a ausência de propósito transforma o trabalho em algo vazio e mecânico. Jack não está criando, não está evoluindo. Ele está apenas preenchendo páginas com palavras sem vida, da mesma forma que muitos preenchem dias, semanas e anos em profissões que não alimentam suas almas.
No hotel Overlook, Jack está isolado, afastado do mundo exterior, o que acelera sua deterioração mental. No mundo real, o isolamento emocional pode ser igualmente devastador. Quando alguém está em um trabalho que não gosta, é comum sentir-se desconectado, como se o ambiente e as pessoas ao redor estivessem em uma frequência diferente. Essa desconexão aprofunda a insatisfação, tornando cada dia mais difícil encontrar motivação ou propósito.
Se Jack representa o trabalhador preso e insatisfeito, Wendy pode ser vista como uma metáfora para aqueles que decidem agir e buscar a saída. Embora sofra com as ações de Jack e os perigos do hotel, Wendy não aceita passivamente o caos. Ela luta, resiste e, eventualmente, escapa. Assim como Wendy, temos o poder de mudar nosso destino profissional. Não é fácil – requer coragem, planejamento e, às vezes, sacrifícios –, mas sempre existe a possibilidade de sair do labirinto e encontrar algo que realmente traga significado.
O Overlook Hotel é mais do que um cenário de terror. Ele é um lembrete de que o ambiente ao nosso redor tem um impacto profundo em nossa mente e em nosso espírito. Trabalhar em algo que não amamos, em um lugar onde não nos sentimos bem, é como viver em um Overlook metafórico: podemos até tentar resistir, mas eventualmente ele começa a nos consumir.
Portanto, O Iluminado não é apenas um filme sobre loucura e terror; é uma história que nos faz refletir sobre nossas próprias escolhas. Estamos em um labirinto sem saída ou buscamos algo que realmente ilumine nosso caminho? Afinal, a vida é curta demais para passar os dias escrevendo páginas sem sentido em uma máquina de escrever.
Pense nisso. Até a próxima.